Thursday 7 July 2005

Vejo, do caminho de casa para o trabalho, nada mais nada menos do que uma muralha romana construída [...]

Após meu post sobre ônibus, comecei a escrever o pedaço acima, mas não terminei, pensando em continuar depois. Hoje venho aqui a escrever de novo, mas não como queria, não para falar de Londres como eu gosto de ver, alegre e vibrante no verão, mas uma Londres diferente de tudo que eu já vi.

Pode parecer engraçado dizer isso agora, mas ontem, quando andei de metrô, na Northern Line, pensei em como seria horrível se tivéssemos que passar por um ataque terrorista no metrô, como aconteceu em Madri. Fui de ônibus de onde trabalho, Moorgate, para Candem Town, passando por King´s Cross. Dormi no ônibus e acordei pela conversa de duas garotas que estavam sentadas atrás de mim. Uma delas não era inglesa e perguntou que prédio tão bonito era aquele mais a frente. A amiga respondeu que era King´s Cross, e eu também olhei, porque sempre gostei muito daquele prédio; colado ali fica a British Library, onde há tantos documentos e livros históricos... Peguei o metrô em Candem Town, e fui até Golder´s Green, para visitar uma escola de inglês que uma amiga minha havia recomendado. Quando terminei, não sei porquê, não quis voltar de metrô. Preferi voltar todo o caminho de ônibus. Se tivesse voltado de metrô, iria novamente até Candem Town e ali pegaria o 168. Esse ônibus passa por Euston, Russel Square, até chegar em Holborn que é onde eu estudo. Mas preferi pegar somente o 13, e depois peguei o 98 que passa até a escola. Mas tudo isso foi ontem.

Hoje, dormi um pouco mais além da hora; quando é assim, normalmente pego o metrô de Elephant & Castle até Moorgate; a viagem é super rápida e assim não chego atrasada. Fiz exatamente isso na terça-feira. Mas, como ontem trabalhei até um pouco depois do meu horário, pensei: ah, hoje vou chegar um pouco atrasada, e vou de ônibus e não de metrô. Peguei meu ônibus no. 100 e desci do ônibus às 8:09 h. Lembrei que meu Travelcard ia acabar, e então dei uma passada rápida na estação de metrô Moorgate, que fica entre o ponto de ônibus e meu trabalho, e comprei meu Travelcard. Era 8:10 da manhã. Fui então para meu trabalho, fazendo o que tenho que fazer todas as manhãs.

Em torno de 10:30 am, meu patrão me pergunta onde eu moro. Eu falo que em Peckham, e ele então me pergunta se tinha alguma estação de metrô por lá. Eu digo que não, que a estação mais próxima é a de Elephant & Castle, a mais ou menos 15 minutos de ônibus da minha casa. (No meu post sobre ônibus abaixo, comentei que gostaria de ter uma estação de metrô mais perto de casa. Já não penso o mesmo hoje!) Ele não responde, e diz que vai dar uma saída. Eu concordo e continuo meus afazeres. Eu trabalho no nível da garagem de um prédio enorme, que tem mais de 20 andares. Lá meu celular fica sem serviço, para receber ou para fazer chamadas. Já sabendo disso, eu coloquei no celular do Alejandro o telefone do meu trabalho, porque se ele precisasse se comunicar comigo, que ligasse para lá, já que meu celular não pegava. Estava então em meus afazeres e o telefone toca; como eu estava sozinha no escritório, atendi. Eram mais ou menos 11 da manhã (7 da manhã no Brasil). Pra minha felicidade ouço a voz do Alejandro falando comigo. Dentro de mim, eu pensei: ué, porque será que ele está me ligando quando ele sabe que estou no trabalho? Será que tem alguma mensagem urgente pra mim, alguma carta que chegou? Ele me pergunta então se eu estou bem, eu digo que sim, e ele me fala: não está sabendo do que aconteceu? Houve explosões no metrô e num ônibus. Onde????? Em Liverpool Street, Aldgate, Edgware Road e no ônibus em Russel Square. Eu fico preocupada, porque Liverpool Street é uns 10 minutos de onde eu trabalho. Ele me pede então pra não ir pra escola, e sim ir pra casa quando sair do trabalho. Falo que ok, que estou bem, e que vou ligar pra ele quando sair. Desligamos, e eu fico nervosa a cada minuto, já não conseguindo me concentrar pro trabalho. Um empregado entra no escritório para assinar o livro de entrada, e eu pergunto se ele sabe do que aconteceu, ele diz que sim, que estava na Embaixada Espanhola e que os {...}

-> São 19:54 agora, Alejando acabou de chegar (foi levar a mãe dele de carro no trabalho) e falou que a rua aqui de casa, assim como outras, ficaram fechadas porque encontraram uma bomba na delegacia de polícia que fica a dois minutos da minha casa! Ale falou que perguntou ao policial, e ele falou que encontraram um pacote lá, e descobriram que era uma bomba! Já foi levada pelo esquadrão anti-bombas e estão começando a deixar o trânsito passar de novo... Aimeudeus, se essa tal bomba explode, eu vou junto, porque moro muito perto da delegacia!!!

{...} ônibus estavam passando muito raramente por Central London, e que todas as estações de metrô estavam fechadas. Aí então que eu fico verdadeiramente nervosa, porque sem ônibus como iria chegar em casa?????????

Meu chefe chega, e então lhe digo que foi por causa do que estava acontecendo que ele me perguntou antes se tinha estação de metrô perto de casa. Ele confirma que sim. Ele liga o rádio e ficamos ouvindo. O telefone toca. Eu corro para atender. É minha amiga Neshe, preocupadíssima comigo porque sabia que eu trabalhava na City (é a parte de Londres onde foi mais atacada). Eu digo que estou bem. Ela me diz pra gente se encontrar (ela também estava no trabalho) pra irmos juntas pra casa. Mas penso: como vamos nos encontrar??? Ela trabalha na parte oeste da cidade, entre Bond Street e Baker Street, e eu na parte leste, em Moorgate. De ônibus, levaria mais ou menos 40 minutos. De metrô, uns 15 minutos. Mas com os dois não funcionando, só um jeito de ir: a pé. Meu chefe me deixou sair mais cedo, peguei minha bolsa, casaco e guarda-chuva e saí. Afora, uma chuva fininha, deixando tudo cinzento. A rua do meu trabalho é uma subidinha, e logo dou de cara com a entrada da estação de Moorgate: fechada e com polícias na rua. Agradeço a Deus ter levado meu guarda-chuva, e tento me orientar para ver como ia chegar lá entre as tantas ruas que teria que passar. Lembro do meu mapa de ruas, que infelizmente tinha deixado em casa (e algo me disse esta manhã pra levá-lo, mas eu não dei caso). Num instante, penso: como eu vou chegar no trabalho da Neshe se não tenho o endereço de lá?? Fui lá só uma vez, mas já fazia muito tempo e pra chegar no lugar certo não é tão fácil. Tento ligar pra ela do meu celular: não consigo, não chama, não dá linha. Lembro que ela me mandou ano passado um text message com o endereço do seu trabalho, para que eu colocasse como referência quando me candidatei num emprego em um café. Isso antes de eu começar a trabalhar em Lycatel, em setembro do ano passado! Com alívio procuro na parte de Messages do meu celular, e lá está: 61 Queen Anne Street. Bem, então sem mapa, tinha que seguir o caminho que o ônibus faz. Me pus a caminho, e pra lá e pra cá, vejo lojas fechadas, pessoas caminhando apressadamente pela rua falando ao celular, um clima pesado, piorado pela chuva fina que cai. Tiro meu celular, dinheiro e cartão do banco da bolsa e coloco num bolso no meu terno, por dentro do meu casaco. Se me roubam a bolsa, pelo menos eu tenho algum dinheiro e o pessoal consegue me contactar pelo celular. E ando, ando, ando. Acho um mapa num quadro numa rua, e ali vejo que estou indo muito para o sul ao invés do oeste. Corrijo minha direção, o que me ajuda muito. Passo pela estação de metrô de Saint Paul´s, e dali sigo numa linha reta que me levará ao meu caminho. Pela rua, táxis passando lotados, com gente fazendo sinal em vão. Pessoas sentadas no ponto de ônibus, esperando por um ônibus que nunca vem. A maioria faz como eu e caminha. Aqui e acolá colho informações do tipo: todas as estações de metrô estão fechadas.. o ônibus do nada explodiu... eu estou bem... como chego até tal lugar?... e mil e outras coisas que fazem minha cabeça rodar. Me dá fome, entro num supermercado que está aberto, compro chocolates, sanduíches e suco, para mim e minha amiga, e continuo caminhando e caminhando... Minhas pernas não doem, não quero demorar a chegar, mantenho o mesmo passo, e só caminho e caminho... Passo próximo a minha escola (que fica próxima ao British Museum, que fica próximo a Russel Square, que foi onde o ônibus explodiu....) e continuo andando. Estou na metade do caminho. Mais e mais carros da polícia passando, táxis que não páram... O povo de Londres fala muito ao celular, mas hoje ultrapassou todos os limites.. era difícil ver alguém que não estivesse usando seu celular. Acho que era por isso que as operadoras estavam tão ocupadas e eu não conseguia uma linha. Todo mundo andava apressado, olhando pra todos os lados; assim como eu. Eu só queria chegar onde estava minha amiga, pra daí irmos pra casa. Pelo menos eu estaria com ela e não sozinha. Eu não acreditava no que estava acontecendo, não parecia a minha cidade que eu amo tanto, mas... uma cidade com pessoas com medo.

Cheguei a Oxford Street. Se aquela rua já é ocupada normalmente, hoje então! Encontrei uma livraria aberta e comprei um mapa. Alejandro me liga e me pergunta onde estou, falando que iria me encontrar onde eu quisesse. Falei que seria melhor que eu e Neshe atravessássemos o rio Tâmisa pra aí ele vir nos buscar, porque do lado norte seria perigoso dirigir. Fui seguindo, e antes de passar pela estação de Oxford Circus, entrei por um outro caminho para não passar lá. Sabia que estaria superlotado aquela região, e eu queria evitar tumulto. Seguindo o mapa, fui andando por ruas transversais, até que cheguei finalmente no trabalho de minha amiga. 1 hora e meia andando, sem parar. 7 kilômetros percorridos. Não consegui conter lágrimas nos olhos quando a abracei. Pelo menos estávamos juntas.

Nos preparamos então para a caminhada para casa, que seria ainda mais longa do que a que eu já tinha feito. Chovia ainda mais forte e agora meu guarda-chuva tinha que ter espaço para duas. Seguimos em direção sul, atravessamos Oxford Street, passamos por Marble Arch. A Embaixada do Brasil fica bem ali perto, numa rua transversal, e quando passo, vejo a bandeira do Brasil voando. Deu ainda mais saudade nesta hora. Fomos andando, ao lado do Hyde Park, e para nosso grande alívio, passou um táxi vazio que parou pra gente, mesmo com outras pessoas dando sinal pra ele. Não acreditei em nossa sorte. Fomos, então, para a casa dela. No caminho, centenas de pessoas andando debaixo da chuva, caminhando para o sul, longe do centro de Londres... Do celular da Neshe, ligo pro Alejandro, dizendo pra ele ir me encontrar na casa dela. O motorista do táxi, muito solícito, chegou rápido em casa apesar do tráfico. Graças a Deus chegamos na casa dela, e então tomo chocolate quentinho e descanso meus pés doloridos. Foi quando tive a oportunidade de entrar na Internet, mandar um email pro pessoal dizendo que estava bem, e escrever a curta mensagem abaixo. Tentei ligar também para minha mãe, mas as linhas estavam ocupadas. Alejandro então, chega!!! Me leva pra casa. Eu cansadíssima, tomo um banho, como, e deito. Ligo pra casa, consigo falar com meu pai. Descanso.

Agora são 9:11 pm.

E daqui da cama, na sala, vendo as notícias na TV, estou escrevendo no blog. E esperando que eu acorde de tudo isso e possa contar como é bom andar de ônibus e de metrô em Londres. Novamente.

PS: As estações em negrito foi onde ocorreram explosões no dia de hoje.
PS2: Obrigada pelo carinho de todos que escreveram preocupados!! Minha família também está bem. Não tenho notícias de todos meus amigos que estão aqui em Londres, mas rezo para que todos estejam bem!

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